Não estou vendo a mamãe. A gente também não via, mas já ouvia muito bem
aquela voz que tanto nos fazia falta. As imagens sempre demoravam a aparecer, e
quando apareciam... Oooooooi, mamãe! Agora estou vendo você. E cadê o papai? Eu
estava ao lado, mas até então fora do esquadro da tela. Oi, Papaizinho! Sabe,
estou com muita, muita, muita saudade de vocês. Eu contava o número de vezes
que Alice intensificava a saudade e também quantas vezes ela usava o vocativo
preferido, às vezes reticente, para ganhar tempo, para se lembrar de tudo o que
tinha vontade de contar e prolongar a conversa: Mamãe... mamãe, olha como o meu
dente está mole. Acho que vai cair antes de vocês chegarem. A gente, claro,
pediu para ela mostrar. Ela se aproximou, mostrando a gengiva, já bastante
banguela, com o dedo balançando o dente.
Olha, titia, o papai está dançando atrás da mamãe! Ele é malucão, né? Estou
com muita, muita saudade. Posso dar um abraço em vocês? Alice abriu os braços e
os cabelos se aproximaram da câmera. Foi ainda mais complicado, mas a gente fez
igual. Mamãe... mamãe, estou com saudade de ler história com o papai. E até com
saudades da bronca dele. Mamãe, o papai não fala por quê? Eu apareci de novo,
dizendo alguma coisa, e ela fez um carinho na tela. Eu perguntei se podia
contar um segredo. Ela sorriu, aproximou a orelha da tela e sussurrou: O que é?
Já sei: você comprou um livro pra mim? Eu confirmei, e Nane emendou perguntando
da escola: se estava tudo bem, se tinha novidades. A festa junina, mãe. E eu já
sei a música que a gente vai dançar. Nane disse que a titia podia mandar o
dinheiro na agenda. Depois, a gente perguntou da escola e também se estava
aprendendo muitas coisas novas. Já fiz o dever de hoje, mamãe. Sabe com quem?
Com o titio. Faço todos os dias com ele.
De repente, o silêncio chegou aumentando a saudade. Para nós dois bastava
ficar ali, olhando pra ela, mas Alice logo encontrou assunto. Mamãe, eu estou
com uma bolinha na perna. Acho que é um molúsculo.
Nane falou para ela não se preocupar, não devia ser, não era molusco. Ela
insistiu: Mas é molúsculo, mãe! Para que
ela deixasse a cisma de lado, a gente perguntou se ela tinha gostado das fotos.
Era uma foto por dia para ela no Facebook. Mamãe, gostei muito da foto do papai
na piscina. A água estava muito gelada, pai? Você ficou com frio? Mamãe, eu
gostei de todas as fotos. Você viu a minha foto? Eu também coloquei uma foto, aquela
com as unhas pintadas... Foi a vovó que pintou, mãe.
Quando o silêncio ameaçava voltar, Nane teve a idéia de mostrar o quarto do
hotel para ela. É outro hotel, mamãe? Era. O que é isso aí em cima? Era um
enfeite da cama. Já foram quantos hotéis? Cinco, faltavam dois. E depois? Vocês
vão para Paris, mamãe?! A gente viu que os olhinhos brilharam. Vocês vão?! O
sorriso se abriu, e Nane perguntou se ela queria alguma coisa de lá. Se ela
continuasse se comportando, talvez merecesse um presente especial. Alice
pensou, levantou as sobrancelhas e abriu ainda mais sorriso antes de dizer: Quero
sim... Xampus novos, mamãe!!!
Ahhh que linda!!!!!!!!!!! Adorei!!! :)
ResponderExcluirSei bem o que é esta saudade de estar do outro lado da câmera... é aquela coisa esquisita de ver e não sentir o cheiro, estar perto, ali na frente, mas a léguas de distância... No meu caso, me contentava e ficar só olhando as macaquices, enquanto ele se exibia na piscina do hotel, dando as suas piruetas e saltos mortais... e nos dias que batia a saudade - coincidentemente no dia em que não tínhamos áudio - foi a mímica que expressou as minhas angústias dizendo em gestos - não chora filho, vai dormir... mamãe ama muito vc...
ResponderExcluirUm barato! Viva a tecnologia. Hoje com o Skype atenuamos as saudades.
ResponderExcluirAbçs,
Ana Maria
:)
ResponderExcluirCriança é mesmo um barato!!! Muito bom o texto!!
ResponderExcluirSaudade da Alice <3
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