domingo, 23 de agosto de 2015

A Rampa da Escola

É um sonho recorrente. Meus passos são vagarosos porque carrego a mochila pesadas nas costas e a lancheira vai sem meio sem jeito, balançando, pendurada no ombro. Junto comigo, os colegas de infância, vestindo jardineiras azuis e amarelas, sobem a rampa da escola, em fila indiana e por ordem de tamanho.

Há sempre algum movimento atrás do portão: são os ônibus e os carros que fazem manobras, com motoristas bigodudos ao volante. Na rampa, porém, a direção fica a cargo das mulheres. São elas que nos mostram o caminho e nos chamam para rezar.

No meu sonho, a rampa é infinita; e o pátio da escola, uma parada obrigatória. Ali, permanecemos todos de pé. À nossa frente, as professoras se colocam em torno da imagem de Nossa Senhora que está sobre uma mesa improvisada como altar. Rezamos de olhos fechados, muito concentrados, até que o som de uma revoada nos desperta. Uma revoada de pombas brancas. Elas pousam no alto do muro que separa a escola do prédio vizinho e ficam ali até o sonho terminar.

Sem perder os pássaros de vista, de vestido rosa sobre a pele clara e os cabelos amarelados arrumados num coque, a pequenina Dona Célia começa a falar com a firmeza que sempre garante o silêncio das crianças. Conta uma história que já conhecemos: de uma menina de 17 anos que se casou com um militar do Exército e foi morar no Sul do país. Depois, emenda um longo sermão – era assim mesmo que a gente dizia – sobre disciplina e dedicação, antes de passar a palavra para a filha.

Tia Mariinha é jovem, morena, usa o os cabelos soltos; discursa sobre o amor de Maria, o milagre da vida e a importância dos estudos. Tem uma voz suave, um estilo diferente da mãe, mas que consegue manter o mesmo silêncio em volta.

De repente, e cedo demais, saio do conforto de que todas essas lembranças misturadas em sonho me trazem. Acordo sozinho no quarto e me resta apenas uma visão embaçada da rampa na parede do quarto.

A rampa da escola é o maior presente que elas me deram.

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