domingo, 28 de junho de 2015

Luiz Rodolpho

Não cheguei a conhecer o meu avô.

Nascido em Belém no fim do século XIX, Luiz Rodolpho era engenheiro romântico e aventureiro. Participou da construção do Porto de Manaus, foi Diretor do Serviço de Navegação da Bacia do Prata, era muito atuante no Clube de Engenharia. Alimentava-se da política e sonhava com as grandes obras.

Era um excelente articulista. Acreditava como poucos na força da expressão escrita. Colecionava diários de viagem, deixava comentários nas margens dos livros, usava correspondências para protestar, questionar, defender, xingar. Por meio delas, chegava a quem quer que fosse, até ao Presidente.

Temos em comum a engenharia e a escrita, e relações diferentes com cada uma delas.

Às terças-feiras, dia que escolhi para visitar meu pai depois da morte da minha avó, temos feito grandes descobertas na biblioteca. Sobre a Mami, ainda encontramos pouco além das fotos de sua juventude aqui no Brasil e da Livraria Sauret, inaugurada em 1941 na loja 5 do Copacabana Palace. O arquivo do vovô Lilito, porém, é imenso. São recortes de jornal, rascunhos de cartas, minutas de discursos, cópias de telegramas, revistas do Clube de Engenharia – tudo organizado em pastas que passaram anos esquecidas nas gavetas da escrivaninha daquele quarto.

Em uma dessas revistas, publicada na década de 1960, a biografia do engenheiro Luiz Rodolpho aparece com grande destaque. São relacionados os projetos e as obras de que participou, os trabalhos que publicou, inclusive uma crítica literária sobre a poetisa argentina Maruja Fernandez. A literatura apareceu como um tema perdido no meio de tantos tratados sobre a engenharia brasileira. Quando perguntei quem era a escritora, papai não soube responder; esboçando um sorriso, disse apenas que o baixinho não era fácil.

Não era mesmo. Uma foto que encontramos registra um desastre de trem a que sobreviveu em viagem ao Nordeste no início do século XX. O agradecimento do General de Gaulle por sua atuação como voluntário da Resistência Francesa no Brasil durante a Segunda Guerra está conservado em um quadro na parede da biblioteca. A história de que ele discursou contra Getúlio sobre um caixote de madeira na frente do Palácio do Catete também não me sai da cabeça. Cada um desses episódios mostra como foram intensos os 96 anos do meu avô.

Aos poucos, a partir das fotos, dos documentos e das lembranças de meu pai, tento traçar um perfil do Luiz Rodolpho. Minha maior motivação é esclarecer o motivo da homenagem, entender por que herdei o nome dele. Os olhares de papai e o zelo com que Mami guardava todos os arquivos revelam, além de grande admiração, uma história de gratidão.

domingo, 14 de junho de 2015

O Time Misto do Nacional

Aos 14 anos, saí da minha zona de conforto pela primeira vez. Como a escola que frequentava desde pequeno não oferecia turmas além da antiga 8ª série, tive que deixá-la para enfrentar todas as novidades de um colégio grande. No entanto, fez muito diferença sair junto com o meu melhor amigo da Escola Degrau, uma segunda casa, onde todos nos conheciam, para estudar no Colégio Santo Agostinho. Ali, demos sorte também com a organização alfabética das turmas, que colocou o Joaquim e o Luiz Rodolpho na mesma sala.

Fazendo parte de uma das turmas tecnológicas do 1º ano, naquele novo espaço, com quadras poliesportivas, corredores lotados de alunos, éramos estranhos facilmente confundidos com aqueles que chegavam da filial do colégio do Novo Leblon. Quando os alunos antigos vinham com perguntas sobre nossa origem, o nome da escola de Copacabana sempre causava um burburinho seguido de algumas risadas – Degrau era um conhecido restaurante do Leblon que ficava na mesma quadra do colégio.

No início da adolescência, o futebol ainda era o primeiro assunto para tentar uma aproximação. Iniciar uma conversa sobre os jogos de domingo, e declarar seu time no momento certo, sempre nos pareceu o caminho mais fácil para fazer novos amigos, já que na quadra não tínhamos muito o que mostrar. Mesmo assim, jogar futebol também era algo a ser conquistado. Ainda que por alguns minutos, esperando o rodízio, a “de fora”, a nossa vez, queríamos fazer parte daquele clube da bola e do Bolinha também.

A primeira partida de que guardo alguma recordação foi disputada em uma das quadras menores, a que ficava mais próxima ao coqueiro. Naquele jogo, depois de uma improvável troca de bolas, ouvi o que pensei ser uma palavra de aprovação do autor do gol: “Gênio”. Apenas algum tempo depois, vim a entender que podia ser também uma expressão de autoelogio do Fraga, a partir daquele lance, meu mais novo amigo. Em outra jogada qualquer, devo ter ouvido também, algumas frases incompreensíveis balbuciadas pelo goleiro Diuana, com as quais logo me acostumei.

Essa forma de tratar os amigos pelo sobrenome era uma consequência inevitável da arrumação das turmas em ordem alfabética. Eram tantos os Flávios, o Guilhermes, os Leonardos, que a única outra opção era um apelido, caso óbvio do zagueiro palmeirense do time, o Paulista. Ao menos, o Joaquim era único, e pôde deixar o seu apelido de infância na escola anterior. No meu caso, apesar de ter descoberto um xará na turma de humanas, fiquei mesmo como Rodolpho, esquecendo de vez o meu primeiro nome.

Mais cedo do que esperávamos, vestimos a camisa azul do Nacional, o time de futebol dos nossos amigos. E assim, passamos a farte parte daquele grupo, que contava também com o Luciano. Embora não estudasse mais lá quando chegamos para cursar o 2º grau, ele nunca se afastou do grupo. Por isso, a dúvida: se ele estava na quadra do colégio nas noites de sexta, no campo de futebol do sítio do Joaquim aos sábados e também em todos os campeonatos de botão na cobertura do Diuana, como não estudou comigo?

Em 2014 completamos 25 anos de amizade. O Clube do Bolinha já era. Essa amizade é compartilhada com nossas mulheres, que desde sempre foram grandes incentivadoras dos encontros do grupo. E hoje em dia são as crianças que nos dão mais motivos para estarmos juntos. Afinal, são 11 aniversários por ano.

E com 11 filhos, sendo cinco meninas, já conseguimos montar um time misto para a nova geração do Nacional.