terça-feira, 9 de agosto de 2011

Cardápio de Memórias

Inspirado no desafio da final da segunda temporada de Top Chef Masters, escrevo aqui meu cardápio de memórias. Nele, a cronologia se sobrepõe ao convencional e a sobremesa intercala pratos quentes.

Se da expectativa pelo leite materno não tenho qualquer lembrança, começo pelos pesados almoços de domingo: rabada com agrião ou dobradinha com feijão branco. Eram artes de minha mãe, que ainda me fazem salivar e agora ignorar as entrelinhas para pedir, com toda a cara-de-pau que um filho pode ter, quatro conchas da dobradinha num pote de plástico da próxima vez, por favor. Neste caso, exclusivo porque sem concorrência. Soube disso quando, em princípio de namoro, usando como desculpa a ascendência dela, levei Nane ao restaurante A Polonesa em Copacabana. Muita coragem da minha parte não resistir à dobradinha ao curry, que os olhos dela fizeram questão de evitar durante toda a noite.

A minha ascendência francesa é, claro, responsável pelo despertar da minha curiosidade gastronômica. A minha vontade de cozinhar se confunde, às vezes, com necessidade de tentar reproduzir os sabores que a minha avó nos proporcionava, embora meu paladar tenha uma leve preferência oriental pelos temperos. Sem me esquecer do inesquecível patê de fígado, eu escolhi uma sobremesa para este parágrafo do cardápio. O Malakoff só dava o ar de sua graça no Natal. Era montado sobre uma fôrma cônica, coberta de biscoitos champagne que, encomendados especialmente para a ocasião, eram molhados no kirsch. Os biscoitos, colocados lado a lado, em diagonal, escondiam o recheio - um delicioso creme de amêndoas, que eram antes cuidadosamente descascadas em água quente. Depois de desenformada, a torta recebia cerejas e as amêndoas restantes para enfeitar.

Ao fogão, sou bagunceiro e vivo de improvisos. Daí a minha preferência por risotos – não aqueles de mamãe, feitos no dia seguinte ao banquete, mas os tradicionais italianos preparados com arroz arbóreo. Acompanhei toda a elaboração do prato pela primeira vez num jantar entre amigos: era um risoto de funghi. Decidi a partir daquele dia me aventurar e logo passei a trocar ingredientes ou me virar com o que restava na despensa e na geladeira. A cozinha se tornou de vez terapia, diversão com aqueles e outros amigos, função de marido e pai nos afazeres domésticos. Dos meus experimentos, prefiro o risoto catupirinha, onde troco o vinho por boa cachaça, uso limão (de preferência, o siciliano) e uma quantidade apenas suficiente catupiry. O prato pode fazer companhia a um salmão com molho teriyaki ou ser o centro das atenções quando repleto de camarões.

Considero o meu desafio cumprido em parte, porque preciso viabilizar o cardápio, dividindo-o em duas refeições: a dobradinha com feijão branco no almoço e o risoto catupirinha com camarões no jantar. Em ambas, ofereceremos salada verde à vontade, com molho de mostarda da Mami que também tentarei reproduzir. Como não sobrarão fatias do Malakoff para a noite, a Nane irá reservar seus imperdíveis cupcakes de cenoura com gotas de chocolate que estão no freezer e preparar o ganache. Falta apenas combinar o dia. Sugestão: meu aniversário se aproxima. Compromisso: para não correr risco de ser posto para fora de casa a vassouradas na manhã seguinte, será providenciada ajuda profissional para limpar a cozinha.

Um comentário:

  1. hummm q delicia
    :)
    salivei !
    que tal publicar a receita desse risotto catupirinha ?
    adorei a idéia !

    ResponderExcluir