sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

O Eixo de Amarante

Toco a campainha e a porta não demora a abrir. Cumprimentamo-nos. Entro na sala de espera e não preciso me sentar. A porta interna, que dá para o consultório, está aberta. Sinal de que já vamos começar. Como sempre, deixo os sapatos antes da porta e largo a mochila no chão ao lado do sofá, antes de ir ao banheiro. Quando retorno, ao me sentar, coloco as pernas de lado, com os pés sobre a almofada. Falo da viagem próxima, das passagens enfim compradas, das expectativas e da nossa animação. E só. Ela propõe então um exercício. Eu aceito a idéia: fecho os olhos, ponho os pés no chão. Minhas costas se ajeitam no encosto e, em posição tão ereta quanto possível, começo a respirar lentamente, com foco na coluna: do sacro à cervical e vice-versa. A respiração é pesada, ofegante, tão difícil quanto o distanciamento. Expiro tanto quanto suspiro. Concentro-me nos incômodos físicos: a coluna reclama, as mãos procuram descanso no assento, no colo; os dedos de uma e outra se misturam. Os pensamentos viajam ao Tao, que está sobre a mesa de cabeceira, intocado, foi presente de Natal e quer me revelar alguma coisa. A viagem é curta. A coluna volta a me incomodar, ainda mais ouço a respiração do que sinto. Resolvo dar o segundo passo e escrevo o meu nome na coluna. Escolho o nome completo, duplo, que parece rimar com o movimento respiratório, ainda um tanto ansioso, impreciso. O corpo se acomoda, encontra alguma posição. O exercício se estabiliza em ritmo imperfeito. Levo assim o foco para o coração – é a última etapa da experiência. Vêm então as idéias transformadas em textos que ainda não foram escritos. Lembro-me daquele que está pronto para ser lido e outros tantos criados em pensamento (mais tarde, este relato passa a frente dos que já tinham sido imaginados). A imagem de minha mulher surge no fim. De repente, os raciocínios não se desenvolvem mais. Apenas respiro e quero acordar. O exercício termina. Abro os olhos e mantenho a posição. Bem relaxado, descrevo ali o que está registrado agora. A interpretação dela é imediata, segura. A minha continua se desenhando. Decido dividir o que experimentei. A coluna é o eixo. A sua interpretação é livre. Por favor, comente.

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