terça-feira, 20 de setembro de 2011

O Primeiro Setlist

Não fazia muito tempo que eu tinha trocado a companhia da Jovem Pan por aquela fita cassete em minhas viagens diárias ao Fundão. A opção pela rádio era circunstancial: eu não tinha um setlist, nem pretendia encontrar uma trilha sonora; eu procurava companhia, mesmo que fosse a de um bate-estaca. Quando havia amigos que pegavam carona, eu desligava o som e preferia uma boa conversa – assunto não faltava. Até então, a minha relação com a música era assim, quase de pouco caso, talvez porque em casa houvesse discos por toda parte menos na vitrola.

Durante 21 anos, a trilha sonora da minha vida foi incidental. Quando criança, esbarrava com o carimbador maluco ou a Emília na televisão. Gostava muito do Gonzaguinha na voz de um amigo peruano do meu pai. Aprendi a respeitar o hino nacional por causa da Marselhesa que fazia a minha avó parar o que estivesse fazendo, levar a mão peito e chorar. Quase adolescente, eu dizia que gostava de samba, mas não conhecia quase nada. No ônibus da escola, sempre tocava Legião. Nas festas que aconteciam em um play em Botafogo, celebrava com os amigos duas versões de Kátia Flávia.

A tal fita mudou meus hábitos: uma boa conversa passou a ter música de fundo; perdeu o sentido interromper uma boa música depois de estacionar o carro na faculdade. Não foi assim, de uma hora outra: precisei ouvir o pedido de um amigo para me tocar. Certo dia, ele protestou quando parei o carro e girei a chave antes corrermos para a sala de aula. Não havia motivo para pressa. Estávamos numa ilha superpovoada, éramos estudantes de engenharia, éramos “Dust in the Wind”.

Se um amor traz muita novidade, no meu caso, trouxe música também, e o primeiro setlist estava na capa da fita que ganhei da Nane quando completamos um mês de namoro. A fita não existe mais, mas a capa está aqui, servindo como amuleto de memória ou cola de prova. Na verdade, não precisava dela para lembrar a primeira música das 24 músicas, “Because the Night”, que já era uma das minhas preferidas. Mas a cola serviu para eu reencontrar uma cartinha no verso da capa: ela esperava que eu guardasse lembranças desse amor no futuro.

Essas lembranças se revelam hoje quando ouço “Wuthering Heights” terminar no rádio e fico aguardando que a música traga Pink Floyd com “Wish You Were Here”.

Ou quando fico procurando “Vincent” atrás das portas (“Touch Me”).

Essas lembranças podem fazer diferença agora: antes de dormir, vou reorganizar as músicas no MP3 para dividirmos os fones de ouvido na cama.

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