terça-feira, 21 de junho de 2011

A Semana do Noivo

As férias de Amarante começaram na semana do leilão. Sem pendências, deixou apenas instruções escritas em folhas de um caderno da empresa para os que ficariam em seu lugar. Durante a primeira semana, teria disponibilidade ao telefone para esclarecimentos eventuais. Depois, em viagem de lua-de-mel rumo a Cusco, ficaria incomunicável. Faltava energia e o racionamento, que trazia oportunidades no trabalho, poderia se tornar um problema no apartamento em que iam morar. Para evitar que tivessem que conviver com uma limitação de 100 kWh de consumo, a primeira tarefa da semana foi preparar a documentação para provar que a casa estava desabitada e solicitar um limite maior à distribuidora. Em visitas diárias ao novo lar, Amarante fez a mudança: todas as roupas, os livros mais queridos e os que ainda não tinha lido, além de alguns objetos de estimação, inclusive a caixa de isopor com os botões preferidos. Não podia faltar também a papelada: contos, velhas poesias e rascunhos literários. Guardadas também em caixa, estavam todas as cartas dos anos de namoro, as fitas-cassete com músicas selecionadas por ela e o rolha do vinho da primeira noite de amor. Se os pedaços do romance já ocupavam seu lugar, aos poucos, ele descobriria os vazios que ainda tinham que ser preenchidos. Seria uma surpresa a cada dia. Se não houvesse cola, voltaria da papelaria no dia seguinte com o kit completo: fita adesiva e crepe, cola branca e em bastão. Para os dias de mudança e arrumação, faltava um banco escada que decidiu comprar imediatamente. Aproveitou a ida às compras para escolher alguns CDs para os amigos que os receberiam em Lima dali a uma semana: as novidades de Legião (com show de 1994 do antigo Metropolitan), Marisa Monte e, claro, Roberto Carlos. De lá saiu com um autopresente: Reveal era o mais novo lançamento do REM, uma das afinidades musicais do casal, para ser tocado no som portátil que foi, durante algum tempo, o único objeto da casa. Na livraria ao lado comprou um dos livros comemorativos dos 50 anos do Maracanã para levar o estádio ao amigo que não deu sorte de conhecê-lo nas duas vezes que tinha visitado o Rio. Voltou ao apartamento para almoçar: sozinho, usou a porção banco da escada recém-adquirida, levantou a mesa instalada na parede da cozinha e assobiou Imitation of Life entre garfadas. No dia do casamento, acordou cedo para buscar as roupas de pinguim alugadas para o evento da noite, “like a Friday fashion show”. Levou com ele, o tio da futura esposa que a levaria até o altar. À tarde foi ao shopping para aparar o corte feito semanas antes e, pela primeira vez, oferecer o rosto à navalha. Não precisou pagar: foi presente do amigo que cortava seu cabelo havia muitos anos. Fora da tampa por uma noite, o noivo Amarante estava pronto. Restava esperar que o trânsito colaborasse, os padrinhos não se atrasassem e que a pontual princesa branquinha entrasse sorrindo na igreja.

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