segunda-feira, 8 de outubro de 2012

O Mistério de Cosme e Damião

Estávamos apenas os dois em casa no domingo. Mamãe viajava. Pegamos o ônibus de manhã para irmos à Primavera dos Livros. E ela reconheceu o caminho que fizemos de outra vez, para o meu trabalho, nas férias de julho. Assim que chegamos, perguntou qual era o nome daquele lugar, o Museu da República. Durante todo o dia, repetimos algumas vezes a palavra república para que ela não caísse no esquecimento. Ali, no Museu da República, Alice se divertiu atravessando as pequenas pontes sobre o lago, indo até as pedras, para ver a tartaruga mais de perto. Brincou também no parquinho e andou pelos estandes procurando por amigos. Encontramos Marcelo autografando seu Palladinum; e eu encontrei os livros que queria.

Voltamos de metrô e almoçamos no shopping das escadas rolantes. A comida portuguesa me fez acreditar que ela fosse escolher bacalhau, mas Alice preferiu frango. Recusou os doces, e eu fiquei babando. Pediu sorvete de sobremesa, de iogurte rosa e branco, com granulados coloridos e marshmallows. Ela me ofereceu diversas colheradas quando sentamos em um banco nos corredores do primeiro piso: É, pai, esquecemos de pegar outra colher. Partimos antes de terminarmos o pote; desta vez, caminhando.

Resolvemos entrar na Casa de Rui Barbosa. E ela fez algumas perguntas enquanto passeávamos pelo jardim. Quem era? Eu mostrei o busto logo na entrada. Mas o que ele fazia? Tentei não explicar muito: era uma pessoa importante, que seu bisavô conhecia, o bisavô que tinha o nome igual ao meu. E ele nasceu muito antes de você? E do vovô? Continuou, e depois ela quis entrar na casa, para ver o banheiro e os sofás que havia na sala. Eu disse que achava melhor deixar para depois, quando aprendesse sobre ele na escola, nas aulas de história. Ela entendeu e, ainda no jardim, trouxe o assunto dos irmãos. Aqueles que morreram. Um deles se chamava... o nome dele se parecia com Daniel. Eram gêmeos. Era o Damião.

Depois de deixar a casa, passamos pela Igreja de Santo Inácio e pela vila onde mamãe tinha morado quando criança, antes de chegar ao Museu do Índio. Até lá, rendeu muito a história de Cosme e seu irmão. A professora não tinha dito como eles tinham morrido, e Alice estava curiosa. Eu respondi somente que eles tinham sido mortos por homens muito maus. Não bastou: disse que podíamos perguntar para a vovó, ou procurar na Internet. Só esqueceu o assunto quando avistou os painéis pendurados na grade do museu.

Sobre os índios, mais perguntas, todas orientadas pelas fotografias que contornavam a casa. Como eles tomam banho? No rio. Eles não usam xampu? Não. O que comem? Peixe, que pescam no rio. E de sobremesa? Ela mesma respondeu: Fruta, né, pai? Não terminou aí. Ficou muito intrigada com o nome da exposição: Presença Invisível. Por que invisível, se eu estou vendo? O que é invisível aqui? O ambiente escuro das salas e o segurança, que caminhava de um lado para outro, aparecia e desaparecia, só vieram a aumentar o mistério. Ele é da polícia, não vai deixar eu mexer nos carimbos, né? Foi difícil convencer, mas ela saiu com os braços tatuados com as pinturas indígenas. Chegou assim na loja, para conhecer um índio de verdade. Ele perguntou do que ela mais tinha gostado no museu, depois mostrou os anéis e os colares de açaí.

Saímos de lá um pouco antes das quatro da tarde, ela com um anel no dedo. Em casa, voltou a perguntar sobre a morte de Cosme e Damião. Procurei na Internet, li que existem algumas versões, talvez tenham sido afogados, queimados, não se sabe. Ela não se satisfez: Depois pergunta pra vovó, tá? Mais uma vez, insistiu: Estou muito curiosa, pai.

Um comentário:

  1. Ah, a curiosidade infantil. Essas crianças sempre nos pegam desprevenidos, uma hora ou outra.
    E em tempos de internet, temos que rebolar para omitir e não enganar, porque elas acabam descobrindo.
    Santo google, hahahaha!

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