domingo, 10 de abril de 2011

A Presidente

Era uma vez uma formiguinha. Nasceu de um poema que escrevi há mais de quinze anos. Era assim diminuta e trabalhadeira. Não parava quieta. Era mãe dos nossos tempos de criança, um tanto dona-de-casa, outro tanto professora; casada com um homem dezessete anos mais velho, de tempos ainda mais remotos. Parou de trabalhar no Banco quando eu nasci, o mesmo em que ela conheceu meu pai (ela caixa, ele cliente). Voltou mais tarde, nas salas de aula. Além dos três que tinha em casa, era assim mãe de outros filhos também. Faltava o diploma, contudo. O sonho tinha sido adiado muitas vezes. Porque ser mãe é abdicar de sonhos íntimos para compartilhar realizações. E ser gente é perder para ganhar. Mas perder não é necessariamente para sempre.

O poema que escrevi foi lido em um dos discursos de sua posse. Poderia ter sido relido no discurso de formatura, se fosse um evento de uma só pessoa. A presidente veio antes da pedagoga, porque a formiguinha trabalhou muito antes de voltar a sonhar. Ela e meu pai sempre tiveram vida social intensa. Começaram com Encontro de Casais e continuaram como leões. Agora repito: minha mãe é dos nossos tempos de criança. Quando ajudaram a fundar o Lions Clube Glória, só os homens participavam das reuniões. Eles eram companheiros leões e as mulheres, gentilmente chamadas de domadoras. Transição completa, elas se tornaram companheiras leão. Mamãe foi a primeira mulher presidente do seu clube.

Alice estava na barriga quando a futura vovó pegou o canudo. Os anos de estudo não foram fáceis. Muito curiosa foi a inversão de papéis: Neidinha ligava pra mim depois das dez (ela nunca dormiu tão tarde como nos tempos de faculdade), reclamava da rigidez de um certo professor ou da prova ruim que tinha feito (da mesma prova ruim em que ela tinha tirado oito e meio). Cabia a nós, filhos, ouvirmos e incentivarmos. E a dissertação de final de curso foi então uma novela mexicana, em que o meu pai era o galã à moda antiga... eu ajudo, eu reviso, eu resolvo.

Neida é a formiga que já foi presidente, estilo doce e dedicada, e é pedagoga, estilo mãe de muitos filhos, do tipo preciso respirar. Os meus versos diziam, e se repetem hoje, assim:

FORMIGA-MÃE

Sabe a formiguinha?
Que nasceu faz pouco tempo
Que andou em pouco tempo,
Continua andando...
Muito brava e corajosa,
Continua buscando...
E tanto andou
Tanto buscou
Que acabou crescendo:
Virou formigona.

Sabe a formigona?
Que nasceu ainda agora
Que perdeu-se há dois minutos,
Continua perdida...
Hesitante e cheia de dúvidas,
Continua buscando...
E tanto tentou
Tanto aceitou
Que acabou recompensada:
Hoje é rainha.

Sabe a rainha?
Que tanto compreende
Que tanto sofretorce,
Ela é mãe!
(De tanto sobreviver,
Por tanto lutar)
E cria várias formiguinhas,
Que nascem felizes
Mas vivem tristes
Iguaizinhas àquela
Que começou esta história.

2 comentários:

  1. é minha mãe tb!!!! com direito a certidão de Jesus e tudo, rs,rs,rs,rs

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  2. Lindo, Rodolpho! Meus pais tb eram do Lions (de Bonsucesso). Minha mãe já foi domadora e companheira leão, rsrsrs...
    Hoje, nós mães somos tão diferentes... aquelas loucas que se revezam entre a casa, o trabalho, o marido e os filhos... Mas no fundo, no fundo sabemos que nunca mais fizeram mães iguais as nossas... Parabéns, para sua mamy-formiguinha-formigona, rainha!

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