domingo, 17 de janeiro de 2010

Carta para Alice

Alice,

Faz tempo que quero escrever para você. Contar minhas histórias, expor minhas idéias e minhas angústias. Tudo para você ler um dia. Até hoje, porém, apenas em pensamento escrevi e reescrevi os primeiros parágrafos. Repetidas vezes, no caminho de volta do trabalho, contei pra mim mesmo sobre o dia em que você entrou em casa pela primeira vez.

Tentando ser preciso, acho que foi no dia 11 de novembro de 2004. Dia em que sua mãe abriu a porta com um sorriso improvável. Um sorriso enorme, do tipo que começa nos olhos. Era dia de semana e ela ainda dava aulas de inglês. Chegava tarde, depois das 9h da noite, muito cansada... por isso, o sorriso era improvável. E o sorriso começava nos olhos porque você era parte dele. Eu sequer desconfiava.

Sua mãe parecia excitada, radiante... você estava nos nossos planos há alguns meses. Mas aquele era também um mês improvável. Mês de um amor só, de uma única chance para você nascer. Sua mãe estava excitada, radiante... tinha guardado pra si, durante quase uma semana, o resultado do teste de farmácia e a expectativa da confirmação.

Quando sua mãe abriu a porta, vi você chegar. Mas não sabia que era você. Ela se sentou no sofá sem desfazer o sorriso. Disse que tinha um presente pra mim. Um dia antes, ela tinha me dado outro presente. Um daqueles presentes sem motivos, sem embrulho e, talvez por isso, delicioso. Era um livro (diferente apenas porque tinha sabor). Segundo ela, daquela vez, o presente vinha embrulhado e só poderia ser desembrulhado dali a alguns meses.

Ela precisou colocar o dedo no umbigo para ficha cair. “Está aqui”. Você não sabe o que é ficha, né? Era uma moedinha que a gente usava para telefonar da rua. E a ficha, naquele dia, era a peça do quebra-cabeça que faltava para o bobão aqui entender que seria pai e que nós seríamos três a partir de então.

Demorei mais de cinco anos para escrever. Tempo suficiente para lembrar os detalhes daquele dia. Tempo suficiente para o texto amadurecer por aí e esperar pela sua leitura. Por tudo isso, temos que agradecer a um certo pai crônico.

Ainda assim, acho que demorei muito tempo para escrever sobre o dia em que você abriu a porta de casa pela primeira vez; sobre o dia em que sua mãe chegou às 9h da noite de um dia comum como a mulher mais feliz do mundo; sobre o dia em que eu soube que seria seu pai.

Beijinhos.

9 comentários:

  1. Ai que coisa linda!!

    Ela vai ficar imensamente feliz de saber dessas histórias lindas =D

    Linda iniciativa ^^

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  2. Que lindo! E lembro que a minha casa tava desmorando em águas escorrendo pelo banheiro as 7 da noite e a Nane disse que vinha ajudar. E eu pensava, mas não tem nada que vcs possam fazer... e nos deram a notícia mais linda de todas!

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  3. Lindo, Rodolpho.

    Quem não reconhece a beleza deste momento não merece a ventura de ser pai.

    Um grande abraço.

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  4. Esse até hoje é meu favorito!!!

    Me emociono cada vez que leio... imaina a Alice maiorzinha lendo isso!!!

    Ficou muito bonito Rodolpho!!!

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  5. Quem me dear ter tido um Pai assim. Vc eh o maximo Ro xx

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  6. Quanta doçura e amor... um brinde à pequena Alice que desde cedo já era capaz de provocar tanta paixão e beleza!

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